sexta-feira, 3 de junho de 2016

“Comunicação e Religião”

FRANCINE BORBA
THIAGO RIBEIRO


        Na apresentação final da disciplina Comunicação Comunitária abordamos alguns aspectos em que os campos da Comunicação e da Religião se relacionam, recortando, sobretudo, no uso que as mega-igrejas contemporâneas, do movimento neopentecostal, fazem dos meios midiáticos (foco na impressa eletrônica), como forma de angariar ou fidelizar membros aos cultos presenciais.

         Essa passagem do templo ao lar deu-se num longo processo histórico, iniciado, pode-se dizer, com a invenção da prensa por Johan Gutemberg (séc. XV). Assertiva esta corroborada pelo próprio uso primário desta técnica (ou tecnologia), que teve como primeiro produto a bíblia, sendo impressa de forma massiva. Á época, a Igreja Católica Apostólica Romana (ICAR), ainda detinha o poderio simbólico-cultural sobre os mais diversos níveis da sociedade, desde a política ao microcosmo comportamental dos indivíduos atomizados.

         Fazendo uma longa viagem espaço-temporal, ‘pousamos’ no Brasil em 1941, onde a rádio Excelsior foi pioneiramente a primeira concessão radiofônica á igreja católica em solo  tupiniquim, fazendo a mensagem cristã, embalada no invólucro institucional chegar à milhares de lares, país afora. O meio midiático eletrônico propiciou a expansão deste tipo de manifestação: nos anos 50, Billy Graham e alguns líderes religiosos dos Estados Unidos iniciaram um movimento de propagação dos ideiais cristãos sob uma outra ótica; com investimentos milionários em locação de horários, as pregações invadiram a televisão. Era o limiar do que hoje é conhecido como Televangelismo. Era também o início desta corrente nova conhecida como Neopentecostalismo, que se configura como uma modernização dos padrões de crença e comportamento no meio cristão. Dentre os aspectos mais relevantes que os diferenciam das correntes cristãs tradicionais, temos:

·      A atuação maciça nos meio de comunicação de massa
·      A inserção político-partidária em vários cargos de agentes públicos
·      A ausência do legalismo comportamental (não-restrição acerca dos modos de vestir, se portar, se expressar, etc)
·      Crença na teologia da prosperidade (corrente teológica que se prioriza a aquisição de bens materiais e as curas de enfermidades)

         Estes são alguns aspectos que os diferenciam ao neopentecostais das correntes de igrejas tradicionais. Essa corrente teve relevante expansão no Brasil, a partir da compra da TV Record nos anos 90, pela Igreja Universal do Reino de Deus, que consolidou um império midiático, com uma programação diversa e pouco voltada à questões religiosas e/ou espiritualistas.

         Nesse mix entre Religião e Comunicação, não podemos deixar de entrever a potência financeira que gira em torno desta ‘máquina de fé’ inserida dentro de um contexto macrossocial  de relações de produção capitalistas . Enredando nesta relação entre capitalismo e ética religiosa, Zizek¹ faz uma valorosa contribuição reflexiva;
“o capitalista ideal é alguém que está pronto para dar sua vida, arriscar tudo simplesmente para que a produção cresça, o lucro cresça e o capital circule. Sua felicidade está totalmente subordinada a isso”.

        Mediante este contexto inescrupuloso, submisso às ordens do Capital financeiro vigente, os indivíduos imbricam todos os tipos de relações (éticas, produtivas, artísticas, religiosas, etc.), numa mesma ‘panela’ de trocas. Onde o que interessa, em última instância, é a aquisição e acumulação de bens materiais.

         E a mídia, enquanto aparato técnico-humano de comunicação social torna-se uma ferramenta amplamente útil para manutenção do poderio classista, através do uso de signos, símbolos de poder e da criação de narrativas próprias. Sobre isso, Bourdieu (2011, p. 14) aponta que:

“o poder simbólico como poder de constituir o dado pela enunciação, de fazer ver e fazer crer, de confirmar ou de transformar a visão do mundo e, deste modo, a ação sobre o mundo, portanto o mundo”.

         É um elemento decisivo na construção de opiniões e na formação identitária de uma camada significativa da população. Sendo assim, as relações entre os campos da Comunicação e da Religião, ultrapassam o sentido primário da propagação estrita  de ideais e doutrinas, desembarcando no interesse privado de determinados grupos organizados, com vistas ao lucro.
O uso dos meios de mídia é feito de forma massiva e, atualmente, através da internet, as macro-organizações religiosas encontraram novo terreno fértil para a disseminação do seu hall temático.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

         Percebemos assim, que a religião (aqui circunscrevemos o cristianismo em forma de organizações religiosas como igrejas, templos, etc.) teve quer enveredar pela trilha histórica e absorver aspectos da “mundanidade”, dantes tão criticados nos seus primórdios organizativos. As mega-igrejas atuais aparecem como uma espécie de solução pontual para um mundo socialmente caótico, onde as amarras da opressão e da exploração (em todos os níveis) ainda rodeiam os indivíduos. Aqui não houve a leviana pretensão de discriminar o campo da espiritualidade e das manifestações místicas; tão importantes na formação de culturas e identidades, além dos relevantes vieses ético-filosóficos que cada religião em maior ou menor grau, proporciona aos indivíduos. Nos detemos na verificação do uso (as vezes, escuso) que alguns grupos fazem da apropriação dos meios midiáticos, para servir à interesses materiais privados, destoando assim, da natureza e função social primária a que historicamente, se prestou o campo espiritual/religioso


REFERENCIAS:



BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2011.






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